20/06/2012

O ato de amar


Amar é sem dúvidas o mais significativo exercício do viver humano. Superando todo e qualquer ato de inteligência e genialidade demonstrável pelo ser humano. Trata-se de um movimento absolutamente natural, involuntário, inconsciente, praticado sem mascaras, sem barganhas e outros meios usados erroneamente na manutenção das relações humanas. O ato de amar não segue esquemas ou acordos centrados em aspectos cuidadosamente estabelecidos e também não se prende a uma sequencia de tempo ou espaço, que atenda a determinados princípios ou rituais.

O ato de amar ocorre pelo simples fato de existir outro ser, que demande atenção e tenha disposição de aceitar o outro, como ele é. O amor é aquecido pela energia que permeia o céu e a terra e tudo que há entre eles, ela une pela vibração dois estranhos, que se tornam um no amor, como já os são na condição de filhos de Deus, o Criador de tudo.

A harmonia é a base da prática do amor, pois o ato de amar não se configura pelas expectativas que tenho em relação a quem direciono meu afeto, se assim for, não estou amando o outro em sua plenitude individual, mas sim o arquétipo projetado e moldado pelo desejo de como quero que o outro seja para mim. A existência deste tipo de vinculo exige necessariamente que o outro, destinatário do meu amor, se anule para atender apenas aquilo que eu julgar importante para nós.

O amor não se mistura com o domínio, o poder não se sobrepõe ao amor, quando o domínio se estabelece o amor simplesmente afasta-se e espera sua oportunidade, pois sendo uma energia vital, nunca se ausenta de quem quer que seja não importando o que fez ou venha a fazer. O amor restabelece o sujeito e todas as suas relações apenas pela inexistência da resistência, energia normalmente movida pelo domínio do poder.

Amar é não resistir, não impor, é aceitar com gratidão e prontidão, pois os erros nas relações humanas, em sua grande maioria são frutos da busca do domínio pela imposição da força. Quando deixo de resistir, acesso infinitas possibilidades de soluções, já que Deus se encontra em tudo que penso, falo e faço.

O caminho mais florido, aparentemente sem aclives ou declives pode não ser o mais recomendado, pode apenas transmitir uma superficial sensação de tranquilidade pela aparente ausência de riscos. Mas o que é realmente um risco, frente à certeza da morte física. Por que temer algo que inevitavelmente irá ocorrer? Parece que o mistério e capricho da morte afugentam a oportunidade de amar. O medo, não seria neste caso, apenas a ausência de percepção do amor de Deus? Já que na condição de filho de Deus, sou espírito e imortal?

Os segredos pessoais são vazios ao sentimento do outro, pois só o próprio detentor pode sentir a intensidade e o valor a eles agregado, inclusive a personalização da aflição movida pela ansiedade e angústia, deles derivadas. O sofrimento sentido por alguém não vale para mensurar o que o outro sente ou sentiu. Cada um acha que o seu sofrimento é maior e porque não mais “cabeludo” que o do outro. Os sofrimentos são normalmente efeito de regressões infantis.

O amor é a liberdade que gera confiança e permite o sentimento de segurança que todo mundo clama, mas só se configura pela ação do desejo de fazer ao outro, a conhecida regra de ouro “faça ao outro aquilo que espera que faça a você”. O ato de amar se sustenta na prontidão e não expectativa individual.

O ser humano vive a angustia da aceitação do outro, mas não abaixa a guarda para buscar o caminho do centro, pois armado da condição do certo e do errado, ignora a possibilidade da existência de opiniões diferentes, baseadas na naturalidade da verdade relativa, que cada pessoa vê e julga tudo a sua volta, segundo os conteúdos assimilados ao longo de sua jornada pela vida. O caminho do centro, base da pregação de amor feita por Jesus Cristo, a Vida é o objetivo e a harmonia o meio de se atingir tal sentimento. Viver harmonicamente não significa buscar o isolamento, fugindo dos conflitos, mas enfrentar os conflitos como meio de manter a harmonia.

O caminho do centro é a alternativa de eliminação do domínio, nele os diferentes tornam-se iguais e os inferiores tornam-se parte de um todo grandioso. Buscar o caminho do centro exige aprender a pensar sobre os próprios pensamentos e sentir os próprios sentimentos, pois a escolha é sempre pessoal e intransferível. Entender que a resistência a estímulos inadequados ou inoportunos, bem como a repressão de desejos movidos fundamentalmente pelo domínio é um ato de sabedoria e propriedade espiritual, fonte do amor.

A frustração é sempre um convite à reflexão da realidade. Portanto, antes de lamentar e sofrer pense se a ocorrência não é uma oportunidade de mudança de rumo e de vida.

A construção do caminho do centro exige saber do outro como eu me comporto com ele e o que represento em sua vida. Se tenho coragem para brigar, impor, maldizer, maltratar e magoar. Por que não converter tudo isso em fatores de agregação de valores positivos e consolidadores de uma nova forma de ser, perguntando ao outro como eu sou para você? Como é viver comigo? Quais meus aspectos negativos, e que a seu ver me atrapalham em vários campos da vida? E o que preciso melhorar para fortalecer nossas relações amorosas?



Quanto mais me percebo sem mascaras, mais aumento minha coragem de admitir que cometo erros, preciso e sou capaz de trocar afetos sem imposições e meus pares amorosos funcionam como guias para mim. Assim,  torno-me infinitamente forte e imbatível.

Lauro Milhomem Coutinho

Psicanalista e Professor

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